terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Rui Polónio Sampaio

Conheci-o bem. Convivi com Ele. Partilhei, muito de perto, do seu percurso das últimas quatro décadas. Foi, por minha iniciativa, consultor jurídico da Câmara Municipal de Matosinhos. Não como acontece agora, com compensações mensais sem regras e sem qualquer critério, recebia uma mensalidade “curta” para o seu prestígio, a sua capacidade, o seu nível intelectual e sobretudo o seu profissionalismo e altos conhecimentos no direito administrativo.

Não foi através desta colaboração que melhor conheci o Rui Polónio. Não foi pela sua actividade profissional que avaliei a sua personalidade e o seu carácter.
Rui Polónio Sampaio foi um homem da cidadania. Um político do socialismo democrático inspirado nas grandes referencias da vida política nacional e europeia. Não era um seguidista, muito menos um socialista de circunstância e, ou “disciplinado” às regras dos aparelhos partidários e muito especialmente do Partido Socialista que o conquistou mas rapidamente o perdeu porque os esquemas partidários não se encaixavam na sua personalidade e no seu carácter.

Ele amava a liberdade, a democracia e direito ao contraditório.
Grande amigo e colega de escritório, durante muitos anos, de Miguel Veiga, por isso, não me surpreendeu a sua veia poética. Ele era , também, um homem da cultura.
Depois da sua experiência como deputado à constituinte, eleito pelo PS, militou na União Democrática da Esquerda Socialista (UDES), de Lopes Cardoso, outro grande socialista, dissidente do PS.
Quando exerci funções na direcção nacional do PS, liderado por Jorge Sampaio, falei com Rui Polónio Sampaio, salientando-lhe que o PS liderado por este grande senhor da vida política e da história recente do PS, merecia voltar a tê-lo como militante. Aceitou de imediato na condição de militante de base. Revoltou-se com os “desvios” do PS de José Sócrates.
Quantas vezes em esporádicos telefonemas me dizia”este PS esvazia-se e dilui-se em interesses que não são os meus e vai perdendo carga ideológica em áreas que não são as minhas (já não sei onde está a direita se no PS ou no PSD). Este não é o PS de Jorge Sampaio que me reconquistou”.
Reagiu duramente contra a sindicalização do PS e a forma como os aparelhos transformaram um partido político num grupo de interesses.
Ele que com Mário Cal Brandão, António Macedo, José Luís Nunes e Carlos Lage, iniciaram a construção do PS no distrito do Porto, com sede na AV. Rodrigues de Freitas, arrepiava-se com a destruição progressiva deste capital político, histórico e humano, protagonizado por socialistas de arribação dos últimos anos. Admirador de Manuel Alegre e ideologicamente ligado ao projecto sampaísta, Rui Polónio Sampaio, despediu-se sem avisar.
Não quis, ou não pode, cumprir a promessa que me fez, há menos de um mês, e, agora sou eu que não posso fazer o que combinei com a sua Senhora, Dra. Maria João Riotinto. Não imaginam o quanto me perturba e me incomoda.
Se estivéssemos num país que soubesse reconhecer os seus maiores e se soubesse valorizar as pessoas verticais e de carácter, a morte de Rui Polónio Sampaio não teria passado de forma tão discreta.
A minha sincera homenagem ao Rui Polónio Sampaio e a gratidão por tudo o que me ensinou.

Narciso Miranda



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