quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Carta aberta a Narciso

Tenho andado a pensar nos propósitos de alguns dirigentes regionais do PS - o partido que, sem ti jamais teria sido o que é – e começo a ficar preocupado.
Vim até aqui ao Minho profundo, que como sabes fica perto de Viana, e resolvi reflectir sobre a coisa. Ou seja, pensar profundamente no modelo judicial socialista, o qual, parece-me, não difere muito do modelo judicial português.

O modelo judicial português (o socialista parece-me igual) diferencia-se dos restantes – e tu sabe-lo bem! – pela originalidade no que toca aos alvos de penas e condenações.
Por exemplo (e esta devo-a a um bom amigo que estudou bem o caso, a partir da posição privilegiada no Governo): se um banqueiro delapida os fundos do banco, prejudicando os accionistas, na maioria dos modelos judiciais, vai preso. Pois em Portugal, terra de brandos costumes e de ainda mais brandos julgamentos, vai preso o gerente da agência bancária, que a seu pedido abriu conta num «off-shore»!
Outro exemplo: se um ministro despacha (e despacha-se) que se farta, pode em qualquer modelo judicial comum ser chamado a contas no Parlamento, em sede de Comissão de Inquérito, ou mesmo na Procuradoria. No nosso modelo não se incomoda o ministro; parte-se do princípio que a culpa – a haver, coisa que raramente acontece - é do contínuo que deixou acumular os despachos e do chefe de Gabinete que já faleceu, ou, já emigrou.
Esta é a lógica justiceira dos dirigentes que agora querem julgar-te.
Toda a gente sabe que não podes comparar-te a eles. És um homem de carácter, de princípios, de causas e de valores. Um socialista a sério!
Poderão, os que agora se arvoram em teus juízes, proclamar o mesmo?
Comparado com o teu, que passado têm eles, para que os acreditemos no presente, e lhes confiemos o futuro?
Toda agente sabe que a tua corrida por fora do PS se ficou a dever à firme determinação de recolocares Matosinhos na calha do progresso e desenvolvimento. Corrigir a rota, ou retomar o rumo, como tantas vezes o disseste. Porque foram eles que se desviaram, e não tu!
Tiveste a lucidez de denunciar, a tempo, o desgoverno municipal.
Tiveste a coragem de enfrentar uma máquina partidária que, desta vez, nos venceu.
Contigo estão muitos dos que nas autárquicas votaram PS.
Sobre este “engano” eleitoral, ainda um dia hei-de dedicar-te um livro!...
Lembra-te das palavras oportunas e certeiras do Presidente da República na tomada de posse do novo Governo, e que podes muito bem interiorizar:
“Se os cargos públicos são efémeros”… “o carácter dos homens é duradouro…”, pelo que “não são os cargos que definem a nossa personalidade, mas aquilo que somos em tudo aquilo que fazemos…”.
E se pensas que, depois de tanto esforço, o reconhecimento não existiu, pensa na resposta daquela criança à ministra Lurdes Rodrigues, depois das obras e dos “Magalhães” (Público 15/10/2009):
“E o que é que gostas mais nesta escola nova?” – perguntou a ministra.
“Da professora”- respondeu o rapaz!

Heitor Ramos

4 comentários:

Anónimo disse...

Extraordinário escrito, pequeno mas correito. Escreve o essencial para lembrar a algumas "personalidades" desta Cidade que, ainda existe alguem que dá mostras em dizer NÃO, ao sensacionalismo fugaz, para não escrevêr outra coisa que bem mereciam, mas... paciência, mas mesmo de JOB.Por escrevêr, lembrarei aos ditos para lerem o SALMO DE JOB nº. 40, e, verão de que se vestem.Socrático

O careca de Leça disse...

Fantástica apreciação.
Primeiro, a conivência do poder com a corrupção.
Depois, a postura cívica de Narciso neste mundo de intriga e de oportunismo.
Ainda bem que há quem tenha a coragem de alertar os cidadãos para estas coisas.

Narciso Miranda disse...

Um abraço amigo. A vossa participação é sempre importante e oportuna.

Narciso Miranda

Matosinhense livre e independente disse...

Gosto sempre de crónicas bem humoradas. E esta é uma delas sem dúvida.
Mostra muita coisa do que são os políticos e do que é a política.
Não conheço Heitor Ramos, mas aprecio imenso a ironia que empresta à sua escrita. Pena é que não seja um bocadinho mais independente. Nota-se muito que é amigo de Narciso, o que até nem lhe fica mal. Eu também sou seu amigo e apreciei imenso a sua acção ao longo dos anos em Matosinhos.