quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Matosinhos real e Matosinhos virtual

Já diz o velho ditado que “o pior cego é aquele que não quer ver”. Não poderia estar mais de acordo. O pior cego é aquele que “enterra a cabeça na areia” para não ver o que está à frente dos seus olhos. O pior cego é aquele que cria uma realidade ilusória, fantasmagórica, na base dos discursos, das ideias, dos projectos, dos estudos, para esconder aquilo que é verdadeiramente real.

Em Matosinhos, há já algum tempo que isto acontece. Já por várias vezes alertei para a distância gigantesca que vai entre aquilo que os cidadãos realmente enfrentam, as suas dificuldades, as suas angústias, as suas preocupações, e o que alguns dos senhores que detêm o poder querem fazer crer, através de discursos “cor-de-rosa”, mas tão diferentes da realidade.
As carências em Matosinhos são, de facto, evidentes. Estão à vista de todos. São sentidas, diariamente, pelos cidadãos que ainda não têm uma habitação digna onde morar, são sentidas pelos cidadãos que enfrentam um nível de desemprego que, no concelho, aumenta assustadoramente, são sentidas nas famílias que se endividam cada dia mais, são sentidas por aqueles que enfrentam uma pobreza envergonhada ou que sofrem com a exclusão social.
E, por isso, não posso deixar de afirmar que, de facto, perante tudo isto, alguma coisa funciona mal. Diria, até, muito mal. Isto, face à contradição desta realidade e o discurso que tem vindo a ser prática corrente da Câmara de Matosinhos de modernidade, de desenvolvimento e de progresso.
Com toda a certeza, não é essa modernidade, esse desenvolvimento e esse progresso que sente, por exemplo, a família que, em Custóias, vive no meio de ratos e esgotos, que o “Jornal de Notícias” divulgou esta terça-feira passada. A notícia dá conta de uma família que está a viver, desde 2007, numa pequena casa, no meio de ratos, onde a água corre pelas paredes e os esgotos correm a céu aberto.
E este, não tenham dúvidas, é apenas um entre muitos outros exemplos. Muitos que se escondem entre as quatro paredes de uma habitação degradada, sem o mínimo de condições e que são, sem dúvida, casos de vergonha para o século em que vivemos.
À Câmara, chegam, diariamente, pedidos, gritos de ajuda. Eu sei, porque ouço muitos. Eu sei porque os eleitos da “Narciso Miranda Matosinhos Sempre” têm recebido vários pedidos de ajuda de cidadãos verdadeiramente desesperados. Desesperados por um emprego, que tarda em aparecer e que arrasta consigo tantas outras dificuldades. Desesperados por uma habitação digna, que os permita sair da verdadeira miséria em que tantas vezes vivem. Desesperados com o aumento brutal das rendas sociais, aumento, esse, tantas vezes determinados por critérios subjectivos.
Sim, constatamos um facto, os mais desfavorecidos, os mais pobres, os que enfrentam maiores dificuldades procuram-nos e são recebidos por nós. Os mais ricos, os mais poderosos, as pessoas dos negócios, esses, têm caminho aberto para serem recebidos pelo poder actual protagonizado pelo PS e PSD/CDS.
Sempre defendi que o poder deve ser frágil, fraco, junto dos mais pobres, forte, determinado e arrogante junto dos mais fortes e dos mais ricos. Não é isso que está acontecer, agora, em Matosinhos.
É por tudo isto que não escondo a revolta quando vejo o dinheiro dos munícipes a ser tão mal gasto. É por tudo isto que não consigo cruzar os braços quando vejo actos de despesismo puro, de esbanjamento claro de dinheiro.
Este é o Matosinhos real, o Matosinhos profundo. Este é o Matosinhos que se contrapõe ao Matosinhos virtual, ao Matosinhos “cor-de-rosa” que é anunciado, sistematicamente.
Se ser fantástico é viver desta forma, se a modernidade é viver no desemprego, é viver no meio de ratos e esgotos, então, inequivocamente, está-se a construir um Matosinhos que em nada tem a ver com aquilo que o cidadão quer e precisa.
Bem sei que a crise internacional é das mais graves das últimas décadas e que também nos afectou e continua a afectar. Mas quem tem três milhões de euros para gastar em publicidade ou 15 milhões de euros para consultorias e assessorias não pode, não deve ficar indiferente a esta realidade. Quem tanto gasta, sem nada produzir.
E se existiram, ao longo dos tempos, um conjunto de problemas (e nesta matéria eu estou plenamente à vontade para falar), hoje, existem outros, para os quais são precisas, são urgentes, de facto, novas soluções.

Narciso Miranda


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